Sou filho de mãe solteira. Uma lavadeira chamada Dona Lourdes. Nasci em uma família humilde. Morei em casa de palha e sei o que significa a palavra ‘pobreza’. A casa onde eu morava, na rua Joaquim Torres, no bairro da Torre, tinha chão de barro batido e cobertura de palha. Casa de um cômodo. Um vão onde se amontoavam minha mãe, minha tia e minha vozinha. Quatro redes balançavam meu sono e o de meu irmão Marcos, Carlos e Toinho.
A ordem do dia sempre foi trabalhar muito, ser digno e não morrer de fome. Muitas vezes eu busquei doações para que a gente pudesse fazer uma refeição. Coletei vidro e papel velho nos terrenos baldios. Dinheiro da venda dessas trepeças era transformado em comida. Vendi bombom nos cinemas de João Pessoa; laranja no campo de futebol Leonardo da Silveira. Vendi amendoim na frente da Malandros do morro. E Bombril e caixa de fósforo no Mercado Central.
Hoje moro na praia do Cabo Branco, o metro quadrado mais caro da cidade. E tenho dificuldade…!!! Semana passada, para fazer a feira eu tomei dinheiro emprestado ao meu irmão. Tem dia que não tenho dinheiro para a gasolina. Repetindo: eu moro no Cabo Branco e me faltam as coisas… Graças a Deus que eu consegui crescer. Mas, 95 por cento da população continuam pobres. Queria que nossos gestores tivessem piedade desse povo.
Por que o isolamento mostra-se menor na periferia? Porque tem que sair para trabalhar e tem que trabalhar escondido! Eu me imagino naquela época em que morava na rua Joaquim Torres, no bairro da Torre, se tivesse uma doença dessas que obrigasse a ficar em casa. Todo mundo numa casa de um cômodo . Ficar em casa para quem mandar a comida pra gente??? Ficar em casa sem trabalhar como??? Estou me sentindo na pele de maior parte da população do Brasil, especialmente de João pessoa, onde moro.
As autoridades precisam ter consciência. Se o pico de contaminação ainda não chegou, quanto tempo mais gente vai ficar dentro de casa? Para sempre? E sem trabalhar e morrendo de fome??? Passei a noite sem dormir pensando nisso. Perceba o absurdo em tudo isso que as camadas mais pobres estão passando!!! Os funcionários públicos estão em casa, mas estão recebendo dinheiro do salario. Mas os feirantes estão vivendo de que???Enquanto os supermercados estão aumentando os preços e enchendo o bolso de dinheiro!
Mil perdões pelo desabafo, mas acredito ser absurdo não pensar soluções econômicas para as camadas mais pobres. Precisamos pensar em soluções no setor de prevenção e tratamento contra o COVID-19 sim!!! Mas, não podemos deixar de pensar em soluções econômicas, que garantam que o trabalhador não venha a morrer de fome. E mais: o pobre não tem R$ 380 para fazer um teste de Covid-19. E esperar pelas autoridades leva uma eternidade…
Minha mãe me ensinou o valor de um homem trabalhador. Trabalho desde que me entendo de gente. Sou um homem são e disposto ao trabalho! Não quero esmola (que mata de vergonha ou vicia o cidadão)!!! Quero garantir o direito de trabalhar e ganhar o meu pão. Eu e os trabalhadores das periferias desse Estado! Não queremos morrer de Covid-19, mas também não queremos morrer de fome.